quarta-feira, maio 12

Manhã

Em 12 de Abril do ano de 2010 a vida revirou-se. Diria mesmo “re-vidou-se”. Numa manhã igual a mil outras o anúncio caiu-me no colo e deixou-me perdida. “O pai, minha querida. O pai morreu.” Sem mais. As palavras mais assustadoras e incríveis (mesmo de não querer crer nelas…) que me foram ditas até hoje. Já estivera antes perto desse medo fundo que é o de perder alguém que nos é querido. Mas nesse dia as palavras não tinham esperança e não tinha motivo para ir em frente e lutar. E então, restou-me ficar ali. Sem reacção. A princípio a perguntar-me mil vezes se tinha ouvido bem, a perguntar porquê e como. A gritar bem fundo a pergunta que de nada serve: “porquê?”. Depois, faltou-me o ar, pensei em correr e em fugir. E senti-me fugir de mim mesma, pois não havia para onde ir. E o ar a rarear e a garganta a fechar-se num nó cego. E a pergunta injusta: “porquê?”
Há momentos em que nos perdemos do mundo. Claramente. E a sensação de perda é tão intensa e tão evidente que só do fundo de algo -  que me pareceu ser a consciência, a razão evidente da necessidade – veio a reacção fria e cortante. “Respira, precisas de respirar…” Por favor deixa-me respirar,. Não chores, não digas mais, não repitas e não me acarinhes. Deixa-me só respirar.”

E depois, depois de conseguir que o ar me deixe viva, a queda. Como que um peso invisível nos ombros e a necessidade imperiosa de me sentar no chão e chorar. Não, não foi tristeza, foi um sentimento sem nome que me deixou mais que vazia. Um sentir assim de impossibilidade que me deixou perto da terra e da segurança de que não iria voar…

E o tempo a passar nos momentos de ir despertando. Num torpor de reagir porque sim. Nas mãos de segurar os outros. Na certeza de que assim me seguraria. E as palavras que têm de ser ditas vezes sem conta. E as respostas, sempre iguais e incrédulas como a minha própria incredulidade. E o olhar em volta à procura de espaço para existir. À procura de ser útil para me sentir viva. E o nó a apertar e eu a atirá-lo para longe de mim…

12 de Abril - 12 de Maio

O Ouvidor do Kimbo

segunda-feira, maio 10

Riscos no céu

Por detrás da nuvem e do cinzento do céu, há azul.
E no meu olhar há traços que aí se desenham.
Linhas e riscos brancos que se cruzam e dançam
no balançar do ritmo apertado do coração e da saudade.
Devagar... no moldar do rosto que guardo dentro,
da presença que me segura.
riscos que se esfumam para rapidamente se tornarem espaço azul
e de novo se desenharem em novas formas que tento nomear.
Aos poucos sei que os riscos no céu, são a minha lembrança,
são os momentos que quero eternos.
Fugaz arquitectura e efémera construção,
o céu assim azul riscado de branco traz-me um pouco de ti.

quarta-feira, maio 5

Caminho.

Custa caminhar sem ouvir a tua voz. 
Custa deixar a pergunta no ar e escutar fundo a tua sabedoria
Custa olhar o espaço sem forma presente e sentir a brisa do tempo a empurrar-me.
Custa não encontrar o ninho onde pousar a minha cabeça e tentar respirar fundo a tua presença. 
De alguma forma nos perdemos quando perdemos alguém.
E depois, caminhamos incertos, na dúvida de uma lembrança eterna ou de um desejo imenso.
Há umas noites acordei de mão dada com o espaço entre mim e o lençol. Na minha mão guardei, todo o dia, a sensação do teu carinho, da tua presença.
E se a serenidade dessa crença me envolve e de me devolve à vida, custa muito não ouvir a tua voz.  



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